Oficinas culinárias realizadas na Fundação Iniciativa promovem autonomia, saúde e afeto entre as crianças acolhidas.
Desde pequenos a palavra “comida” nos desperta diferentes sensações: alegria pelo sabor inesquecível do nosso prato favorito; caretas ao lembrar de alimentos que não gostamos; gratidão pelos momentos em que sentamos à mesa com quem amamos; diversão nas festas onde compartilhamos refeições especiais e, claro, a espera pela decisão de quem vai lavar a louça.
Para além dessas memórias afetivas e da troca cotidiana que acontece ao redor da mesa, a alimentação também cumpre um papel fundamental no desenvolvimento de hábitos saudáveis desde a infância, refletindo diretamente em aspectos relacionados à saúde, bem-estar e autocuidado das pessoas.
Pensando em promover a autonomia e bons hábitos alimentares por meio da educação nutricional, a Fundação Iniciativa criou o Projeto Sabor, Saber e Brincar. Através de oficinas semanais, as crianças acolhidas aprendem técnicas básicas de preparo de alimentos, exploram novos sabores e ingredientes e desenvolvem importantes habilidades sociais, como o trabalho em equipe e a cooperação.
Como funcionam as atividades
Durante os encontros, que ocorrem semanalmente nas casas-lares, as atividades são conduzidas por nutricionistas e divididas em dois grupos, de acordo com a faixa etária dos acolhidos.
As crianças maiores têm participação ativa na escolha das receitas, muitas vezes optando por seus pratos favoritos, que são adaptados conforme a disponibilidade dos ingredientes. Segundo uma das nutricionistas que acompanham o projeto, Vane Kremer, é comum acrescentar um toque nutricional às preparações, como a inclusão de abobrinha na lasanha, por exemplo.
Já com o grupo das crianças menores, os encontros priorizam preparos que estimulem a exploração sensorial dos alimentos, despertando curiosidade e familiaridade com diferentes texturas, cores e sabores.
Em todos os encontros, a conversa sobre a importância de uma alimentação saudável e equilibrada é constante. “Gosto sempre de lembrar que podemos comer tudo o que gostamos, mas não a todo momento”, explica a nutricionista.
Os dois grupos participam ativamente de todas as etapas do preparo, inclusive da limpeza e organização do ambiente, adaptando os níveis de dificuldade à faixa etária. Com as crianças menores são abordados assuntos mais básicos, como a importância de lavar as mãos, evitar levar as mãos à boca durante o preparo e aprender o nome, a cor e a textura dos alimentos. As oficinas com os pequenos são, em maioria, descontraídas e sensoriais.
Já com as crianças maiores, além dessas orientações, são introduzidas noções de segurança na cozinha, como segurar o cabo da panela ao cozinhar, não usar a faca virada para si e outras técnicas básicas como cozinhar arroz, grelhar um bife ou cortar legumes e vegetais.

Mais do que trabalhar com receitas
Além das atividades com as crianças, os encontros também envolvem as mães sociais. Com elas são abordados temas voltados às boas práticas de manipulação de alimentos, um conjunto de normas de higiene que visa garantir a segurança alimentar dos acolhidos.
Vane explica que os conteúdos abordam desde o uso correto de touca e a higienização adequada das mãos, até o cuidado com o ambiente e os utensílios, o uso seguro do cloro e a separação correta dos resíduos. Também são enfatizados aspectos importantes como o recebimento e armazenamento dos alimentos, com foco na conservação e validade dos produtos. Além disso, são ensinadas às cuidadoras práticas seguras de manipulação, como evitar a contaminação cruzada ao preparar os alimentos na ordem adequada e realizar o descongelamento correto de carnes.
Dentro da cozinha, além de explorar as possibilidades de uma alimentação saudável e saborosa, os conhecimentos adquiridos nas oficinas são colocados em prática, criando um elo entre a segurança alimentar, do âmbito higiênico-sanitário, e a segurança nutricional, do âmbito alimentação saudável, destaca Vane.
Ainda segundo a nutricionista, as receitas são programadas a partir do recebimento das doações do CEASA e do Mesa Brasil, otimizando o uso integral dos alimentos e evitando o desperdício.
Educação alimentar como princípio de autonomia
Mais do que ensinar receitas, o projeto Sabor, Saber e Brincar promove uma verdadeira educação alimentar, com reflexos que podem acompanhar a criança durante toda sua vida. O objetivo é que, ao aprenderem sobre escolhas alimentares e práticas conscientes desde cedo, elas desenvolvam hábitos saudáveis que se mantêm na vida adulta.
De acordo com a nutricionista, a formação proporcionada pelas oficinas ajuda a reduzir, no futuro, os riscos de doenças associadas à má-alimentação, como diabetes, hipertensão, obesidade e doenças cardiovasculares. “Crianças saudáveis serão adultos saudáveis” afirma.
Outro aspecto do projeto é o fortalecimento da autonomia. Ao participar ativamente do processo culinário, como manusear os utensílios de cozinha, escolher os alimentos e aprender como prepará-los, as crianças desenvolvem habilidades motoras, cognitivas e sociais. O trabalho em equipe e a divisão de tarefas reforçam o desenvolvimento da autoestima e do senso de cooperação das crianças.
Além disso, as oficinas promovem um vínculo afetivo com a comida, rompendo com a ideia de alimentação como obrigação ou consumo impulsivo. “Em um mundo dominado por comidas prontas, embaladas de forma chamativa e de baixo custo, saber cozinhar é a garantia de um futuro mais saudável”, destaca a nutricionista. Para ela, a partir da educação nutricional as crianças aprendem a ter um bom relacionamento com a comida, sem excessos ou restrições que possam levar a distúrbios alimentares.
O desenvolvimento sensorial realizado com as crianças menores também ocupa um lugar de destaque: ao explorar os cinco sentidos, os pequenos descobrem novas possibilidades, aprimoram a coordenação motora ao manipular utensílios e alimentos, e experimentam o preparo das refeições como um gesto de carinho e cuidado.
Colocando a mão na massa!
Durante o Jantar Beneficente “Desenhando Sonhos”, em comemoração aos 37 anos da Fundação Iniciativa, os convidados puderam experimentar um pouco do sabor deste projeto, saboreando duas receitas que fazem parte das oficinas do Sabor, Saber e Brincar: um biscoito nutritivo e uma geleia artesanal.
Mais do que ingredientes misturados, esses preparos carregam afeto, aprendizado e o cuidado que cultivamos em cada encontro com as crianças na cozinha.
Confira as receitas a seguir:
BISCOITO
Ingredientes
- 1 xícara (chá) de farinha de trigo integral
- 1 colher (chá) de fermento em pó
- 2 colheres de sopa de manteiga (gelada)
- 2 colheres de sopa de açúcar mascavo (demerara ou adoçante)
- 3 colheres de sopa de leite
- 1/2 xícara (chá) de maçã (com casca, ralada grossa)
- 1 colher (chá) de canela em pó1 ovo batido ( para pincelar)
Modo de preparo
Em uma tigela, coloque a farinha de trigo, o fermento em pó e a manteiga. Com a ajuda de um garfo, vá desmanchando a manteiga até formar pequenos pedaços. Em seguida, use as pontas dos dedos para misturar delicadamente até obter uma textura de farofa úmida.
Acrescente a maçã ralada e a canela em pó à farofa. Misture levemente e junte o açúcar e o leite. Mexa até formar uma massa macia — ela ainda estará um pouco grudenta neste ponto.
Transfira para uma superfície enfarinhada e com a ajuda de um rolo de massa, abra a massa até atingir cerca de 1 cm de espessura. Corte os biscoitos com um cortador no formato desejado.4. Distribua os biscoitos em uma assadeira untada e pincele o ovo batido em cada um. Leve ao forno pré-aquecido a 180 °C e asse por aproximadamente 20 minutos, ou até que estejam levemente dourados.

GELEIA DE ABACAXI SEM AÇÚCAR
Ingredientes
- 1/2 abacaxi maduro
- 1 maçã grande com casca (ralada)
- Suco de meio limão
- 1/2 colher (café) de sal (1 pitada)
Modo de preparo
Pique o abacaxi e leve ao fogo médio com a maçã ralada, o suco de limão e o sal.
Cozinhe por 20 a 30 minutos, mexendo às vezes, até engrossar e os pedaços se desmancharem.
Deixe esfriar e armazene em pote esterilizado na geladeira.

Por: Aline Pfeil